Brincando na Escola

"Escola é o lugar onde se faz amigos. Não se trata só de prédios, salas, quadros, programas, horários, conceitos... Escola é, sobretudo, gente, gente que trabalha, que estuda, que se alegra, se conhece, se estima.(...) Importante na escola não é só estudar, não é só trabalhar, é também criar laços de amizade(...)" Rubem Alves

sexta-feira, 8 de agosto de 2008

Saci Pererê


O Saci-Pererê
É um duende idealizado pelos indígenas brasileiros como apavorante guardião das florestas. A princípio ele era um curumim perneta, de cabelos avermelhados, encantador de crianças e adultos que pertubava o silêncio das matas. Em contato com o elemento africano e a supertição dos brancos, recebeu o cognome de Taperê, Pererê Sá Pereira, etc. Tornou-se negro, ganhou um gorro vermelho e um cachimbo na boca. Em alguns lugares, como às margens do rio São Francisco, adquiriu duas penas e a personalidade de um demônio rural que faz travessuras e gosta de enganar pessoas. É o famoso Romão ou Romãozinho. Na zona fronteiriça ao Paraguai ele é um anão do tamanho de um menino de 7 a 8 anos, que gosta de roubar criaturas dos povoados e largá-las em lugar de difícil acesso. Talvez devido aos vestígios culturais trazidos pelos bandeirantes em suas andanças pelo sul do Brasil, o saci mineiro recebeu, além dessas qualidades do "Yaci-Yaterê" guarani, um bastão, laço ou cinto, que usa como a "vara de condão" das fadas européias. Sincretizado freqüentemente como o capeta, tem medo de rosários e de imagens de santos. Quando quer desaparecer, transforma-se num corrupio de vento.¹



Através de Tio Barnabé, um dos seus personagens, Monteiro Lobato descreve o Saci-Pererê:
O saci é um diabinho de uma perna só que anda solto pelo mundo, armando reinações de toda sorte: azeda o leite, quebra pontas das agulhas, esconde as tesourinhas de unha, embaraça os novelos de linha, faz o dedal das costureiras cair nos buracos, bota moscas na sopa, queima o feijão que está no fogo, gora os ovos das ninhadas. Quando encontra um prego, vira ele de ponta pra riba para que espete o pé do primeiro que passa. Tudo que numa casa acontece de ruim é sempre arte do saci. Não contente com isso, também atormenta os cachorros, atropela as galinhas e persegue os cavalos no pasto, chupando o sangue deles. O saci não faz maldade grande, mas não há maldade pequenina que não faça.
Tio Barnabé continua:
- Tinha anoitecido e eu estava sozinho em casa, rezando as minhas rezas. Rezei, e depois me deu vontade de comer pipoca. Fui ali no fumeiro e escolhi uma espiga de milho bem seca. Debulhei o milho numa caçarola, pus a caçarola no fogo e vim para este canto picar fumo pro pito. Nisto ouvi no terreiro um barulhinho que não me engana. "Vai ver que é saci!" - pensei comigo. - E era mesmo. Dali a pouco um saci preto que nem carvão, de carapuça vermelha e pitinho na boca, apareceu na janela. Eu imediatamente me encolhi no meu canto e fingi que estava dormindo. Ele espiou de um lado e de outro e por fim pulou para dentro. Veio vindo, chegou pertinho de mim, escutou os meus roncos e convenceu-se de que eu estava mesmo dormindo. Então começou a reinar na casa. Remexeu tudo, que nem mulher velha, sempre farejando o ar com o seu narizinho muito aceso. Nisto o milho começou a chiar na caçarola e ele dirigiu-se para o fogão. Ficou de cócoras no cabo da caçarola, fazendo micagens. Estava "rezando" o milho, como se diz. E adeus pipoca! Cada grão que o saci reza não rebenta mais, vira piruá. Dali saiu para bulir numa ninhada de ovos que a minha carijó calçuda estava chocando num balaio velho, naquele canto. A pobre galinha quase que morreu de susto. Fez cró, cró, cró... e voou do ninho feito uma louca, mais arrepiada que um ouriço-cacheiro. Resultado: o saci rezou os ovos e todos goraram. Em seguida pôs-se a procurar o meu pito de barro. Achou o pito naquela mesa, pôs uma brasinha dentro e paque, paque, paque... tirou justamente sete fumaçadas. O saci gosta multo do número sete. Eu disse cá camigo: "Deixe estar, coisa-ruinzinho, que eu ainda apronto uma boa para você. Você há de voltar outro dia e eu te curo." E assim aconteceu. Depois de muito virar e mexer, o sacizinho foi-se embora e eu fiquei armando o meu plano para assim que ele voltasse. Na sexta-feira seguinte apareceu aqui outra vez às mesmas horas. Espiou da janela, ouviu os meus roncos fingidos, pulou para dentro. Remexeu em tudo, como da primeira vez, e depois foi atrás do pito que eu tinha guardado no mesmo lugar. Pôs o pito na boca e foi ao fogão buscar uma brasinha, que trouxe dançando nas mãos. Tem as mãos furadinhas bem no centro da palma; quando carrega brasa, vem brincando com ela, fazendo ela passar de uma para a outra mão pelo furo. Trouxe a brasa, pôs a brasa no pito e sentou-se de pernas cruzadas para fumar com todo o seu sossego. Quando quer cruza as pernas como se tivesse duas! São coisas que só ele entende e ninguém pode explicar. Cruzou as pernas e começou a tirar baforadas, uma atrás da outra, muito satisfeito da vida. Mas de repente, puf! aquele estouro e aquela fumaceira!... O saci deu tamanho pinote que foi parar lá longe, e saiu ventando pela janela fora. Eu tinha socado pólvora no fundo do pito – exclamou tio Barnabé, dando uma risada gostosa. – A pólvora explodiu justamente quando ele estava dando a fumaçada número sete, e o saci, com a cara toda sapecada, raspou-se para nunca mais voltar.